sexta-feira, 8 de maio de 2020

Orientação aos Prefeitos Municipais e CMAS na construção do Plano de Contingência na Assistência Social na Covid19


Aos Prefeitos dos municípios da Baixada Santista e
Conselhos Municipais de Assistência Social

O Fórum Regional de Trabalhadoras/es do Sistema Único de Assistência Social da Baixada Santista (Fortsuas-BS), apresenta às autoridades municipais da baixada santista, documento que procura subsidiar a elaboração do plano de contingência para os serviços de assistência social no contexto da pandemia da Covid-19. 
A Política Nacional de Assistência Social (PNAS), de 2004, inaugura um campo de responsabilidade pública jamais visto no país. O Sistema Único de Assistência Social (SUAS) e a Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais (2009), fizeram com que os municípios desenvolvessem estratégias de implantação e implementação do direito socioassistencial a partir de uma rede de serviços, benefícios e transferência de renda.
Esta Política foi construída para ofertar proteção social ao cidadão-usuário que vive diversas formas de desproteção social (renda, alimentação, condições de habitação, violência familiar e social, entre muitas outras). Para toda desproteção social deve-se ofertar, pela primazia estatal e pelo sistema complementar, as seguranças sociais devidas.
Ao tratarmos esta política social como direito, integrante da seguridade social (em conjunto com saúde e previdência social), supera-se o desafio da ação conservadora, caritativa e ligada a focalização e seletividade. Dá-se a distributividade e o reconhecimento da proteção social, referendando o estatuto de política estatal descrito desde a Constituição Federal de 1998 (CF/1988).     
O SUAS organiza o que está determinado pela PNAS que, por sua vez, materializa o conteúdo da Constituição Federal, portanto tratam-se de normativas nacionais que envolveram vários atores sociais em um grande pacto nacional que contou com o parlamento, trabalhadoras/es sociais, gestores, categorias profissionais e cidadãos usuários.
Com a pandemia, pela ocorrência do novo coronavírus, a política de assistência social, já uma política “básica”, universal e de proteção, assim como política de saúde, é reconhecida como ação ESSENCIAL, para garantir a sobrevivência digna da população. Portanto, uma política de Estado e não de governo.
Há que se esclarecer que a essencialidade dada à PNAS deve partir da análise das finalidades da política (ofertas de serviços nos territórios) caso contrário retomaremos os rumos de benemerência e filantropia.
A região tem encontrado inúmeras dificuldades para administrar e gerir serviços e servidores. Isso em razão do inédito momento da pandemia mas também pelo resultado de uma prática que está sendo reduzida ao cadastramento e a decisões de gestão: onde está a centralidade de quem realmente opera na ponta com as famílias, comunidades, que deveria ter sua prática e conhecimento sendo usados a favor da proteção nesta crise? Cadê a Gestão do Trabalho, a Educação Permanente, que deveriam ter dados frutos e profissionalizado esta política e que, agora, poderiam estar orientando a condução dos serviços?
Centros de referência estão sendo fechados quando milhares de pessoas, mais necessitam de apoio e orientação. Num primeiro momento, se entende que esta medida foi profilática para diminuir a contaminação de Covid-19 entre a população e os trabalhadores. Mas até quando esta será a principal estratégia das gestões? Como está sendo planejada a atuação de TODOS os serviços de proteção social básica e da proteção social especial? Qual a estratégia das gestões para de fato cumprirem seu papel e responsabilidade de garantir condições de proteção à população mais vulnerável e a que, sabemos, será a mais atingida pela doença? Como a Assistência social agirá neste estado de emergência e calamidade pública?
O Ministério da Cidadania e a Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social emitiram diversas e inúmeras publicações de orientação para a reorganização dos serviços. É momento de as prefeituras organizarem planejadamente suas ações e garantir transparência à sociedade. Mais, é necessário que as trabalhadoras/es da Política de Assistência Social sejam atores centrais desse planejamento – não é hora de deixar estes profissionais na “geladeira”.
No sentido e considerando que:
·         A partir do dia 05 de maio, os municípios passaram a receber recursos financeiros extras (Portaria 369/2020 do Ministério da Cidadania), e que o papel deste Fórum é mobilizar as trabalhadoras/es do SUAS e atuar no controle social;

·         para garantir os serviços essenciais gestados pelo SUAS é necessário que as trabalhadoras/es sociais atuem em condições de segurança e saúde garantidas pela gestão local;

·         os serviços socioassistenciais na Baixada Santista já operam de forma precária, sem oferecer minimamente condições de trabalho aos profissionais de forma segura, eficaz e remota junto às famílias;

·         as secretarias municipais precisam planejar e tornar transparente as medidas tomadas para garantir o acesso da população aos auxílios governamentais e demais serviços socioassistenciais durante a pandemia, sob risco de ser denunciadas por omissão ou negligência;

·         os Conselhos municipais precisam monitorar e fiscalizar as gestões de assistência social e os serviços socioassistenciais das unidades públicas e as inscritas, sob risco de serem denunciados por omissão ou negligência.


O FORTSUAS-BS propõe ações para a elaboração de um “plano de contingência”, a ser construído de acordo com a realidade de cada município e que deverá contar com a participação de representantes de movimentos sociais e populares, universidades, entidades de representação da sociedade, profissionais da saúde e da assistência e representantes do poder público local.
1. Comitê de crise para combate da pandemia:
·         Criação de “comitê de crise” para integração das diferentes pastas setoriais, estadual e municipal incluindo a assistência social, que seja responsável pela condução das ações da prefeitura para combater a pandemia da Covid-19,  bem como por organizações comunitárias, com representação de trabalhadoras/es e cidadãos usuários dos serviços de base dessas políticas, como CRAS, UBSs, Escolas. Sugere-se a fundamental mobilização dos profissionais dos CRAS, que já conhecem os territórios e que têm em mãos informações preciosas contidas no Cadastro Único e no Bolsa Família. Fundamental que as equipes de profissionais de assistência social sejam escutados sobre as necessidades e demandas.

·         O “comitê de crise” será responsável por monitorar as ações de prevenção e atendimento, coordenando a atualização do “Painel de Situação da Covid-19” e a execução das campanhas de comunicação. Assim, uma de suas atribuições deverá ser a de facilitar o acesso à hospedagem em hotéis e outros espaços de indivíduos pertencentes aos grupos risco. Também terá a função de conectar a situação local dos territórios com as demais unidades e órgãos do sistema de saúde, favorecendo as ações para a construção de um Programa sistêmico de atenção em saúde para a população.
2. Trabalhadoras e Trabalhadores:
  • Definição de novas rotinas de trabalho nos serviços a partir de diálogo com os trabalhadores de base dos serviços e não de maneira individualizada;
·         Regime de revezamento e horários alternativos de trabalho;

·         Colocação em teletrabalho além da dispensa das trabalhadoras em grupos de risco;

·         Remanejamento de profissionais de serviços suspensos para apoiar os serviços de linha de frente (centros e serviços de acolhimento, por exemplo);

·         Aquisição de equipamentos de proteção individual (EPIs) e equipamentos de proteção coletiva (EPC), conforme necessidade de cada serviço;

·         Instrução permanente para uso seguro dos EPIs;

·         Orientação e capacitação sobre procedimentos para atuação segura nos serviços junto à população (não basta ter os equipamentos e não considerar condicionantes da atuação);

·         Suporte emocional e familiar a profissionais da “linha de frente”.
3. Planejamento dos serviços

·         Planejamento do funcionamento dos serviços com linhas gerais para: CRAS, CREAS, Centro Pop, Centro Dia, Acolhimentos Institucionais;

·         Criação de estratégia de comunicação integral e horizontal da gestão com as trabalhadoras/es dos serviços, com o objetivo de informar a real situação do município e de infectados nos serviços respectivos, e para comunicar sobre as novas rotinas de trabalho por meios formais e coletivos (para toda da equipe), inclusive às trabalhadoras/es que estão em trabalho domiciliar, para que todos tenham acesso ao que está sendo desenvolvido no serviço. Importante que essa comunicação não ocorra de maneira informal (via WhatsApp, por exemplo) e de forma individualizada e desarticulada. Considera-se aqui a necessidade de que as coordenações dos serviços façam a comunicação dos direcionamentos, tanto para a gestão, quanto para as trabalhadoras/es a fim de que as ações sejam compartilhadas e articuladas;

4. Atendimento, isolamento e comunicação:

·         No que se refere à comunicação, diante da necessidade de uma verdadeira pedagogia comportamental de aplicação de protocolos de cuidados de isolamento social e de higiene, a busca pela boa informação e orientação depende da implementação de estratégias mais intensivas e capilares, capazes de chegar a todos, e de incidir pedagogicamente em suas atitudes. Muitas dessas estratégias já estão disponíveis, mas precisam ser potencializadas. E nesse momento, a mais importante seria a distribuição de máscaras associada à massificação das boas práticas de seu uso.

·         Criação de estratégia de comunicação e transmissão de informações à população por território, com uso de carros, redes de comunicação e outros;

·         Criação de estratégia de comunicação entre proteções sociais e serviços dos territórios;

·         Envio de comunicados por escrito, sobre ações e estratégias, aos trabalhadores das escolas, unidades de saúde, conselhos tutelares, serviços de justiça

·         Criação de estratégia de comunicação com a Saúde do território.
  • Informar a população das novas formas de atendimento nos centros de referência, de forma a evitar idas desnecessárias aos serviços e a aglomerações de pessoas;

  • Disponibilizar e divulgar linhas telefônicas centrais na prefeitura para informar e tirar dúvidas da população sobre o funcionamento dos serviços;

  • Colocação de proteção física para atendimento em centros de referência e para o cadastro único, como os de acrílico utilizados em guichês de supermercado;

  • Contratação de centrais telefônicas para atender às dúvidas e orientar a população sobre o auxílio emergencial e serviços socioassistenciais, de forma a retirar o foco sobre os CRAS e evitar aglomerações como as que têm sido registradas diariamente em diversas localidades;

  • Organização de linha de WhatsApp no perfil exclusivo de administrador para somente enviar mensagens às famílias, a exemplo da linha do Ministério da Saúde;

  • Estruturação dos centros de referências com linhas telefônicas, internet, computadores, celulares (linha privada não é do serviço, é particular), e demais equipamentos eletrônicos e de comunicação necessários ao bom desenvolvimento dos trabalhos (locais de trabalho precários e deprimentes não possibilitam o melhor desempenho das trabalhadoras/es, com razão);

  • Organização de espaços alternativos para o isolamento de indivíduos contaminados com Covid-19 que não estejam em situação de isolamento em equipamento da Saúde;

  • Uso de hotéis para isolamento de pessoas em situação de rua que necessitem estar em isolamento por suspeita ou infectados pela Covid-19;

  • Provisão de insumos de proteção como máscaras e produtos de desinfecção às pessoas atendidas em serviços de acolhimento, serviços de atendimento à população em situação de rua, incluindo a abordagem social).

  • Atendimentos itinerários de equipes nos territórios de modo a levar informação à população e apoiar na identificação de casos de falta de renda, abandono ou abuso e outras violências.

  • Assegurar o abastecimento de água, esgotamento sanitário e disponibilidade de equipamentos para realização da higiene pessoal em asilos e demais residências comunitárias que abrigam idosos com baixa capacidade financeira e em cadeias e presídios, considerando o risco de rápida disseminação da doença.

5. Vigilância socioassistencial

  • Equipes de vigilância socioassistencial/gestão deverão produzir informações sobre os territórios nos bairros de aglomeração de famílias e habitações subnormais, para atuação das equipes para informação e identificação de possíveis casos de pessoas com Covid-19;

  • Produção de informação monitorando casos de pessoas atendidas nos serviços com suspeita ou confirmação de Covid-19;

  • Elaboração de diagnóstico da situação de cada território, com apoio de dados da saúde, quanto ao alcance dos equipamentos de saúde locais, para melhor aproveitamento dos recursos disponíveis e identificação de lacunas que precisam ser supridas.
  • Importante que os serviços socioassistenciais atuem de forma articulada. Que as ações de proteção social sejam organizadas entre os serviços que compõem a rede, com a definição de novos fluxos de trabalho que possam ser adotados de modo a atender as necessidades da população no atual contexto.

6. Articulação intersetorial


  • Ações para a garantia de água e saneamento básico em territórios e bairros suscetíveis a proliferação da doença por falta de condições de habitabilidade. Suspensão dos cortes de fornecimento de água devido a inadimplência, bem como religação das famílias que estão com suas ligações cortadas e suspensão da cobrança das contas de água nesses territórios e interrupção dos procedimentos de redução da pressão nas redes, para garantir disponibilidade de água com pressão necessária para todos os moradores 24h por dia; e expansão do abastecimento de água emergencial para as áreas não atendidas ou precariamente atendidas, através de caminhão pipa ou outros meios;

  • Garantia de desinfecção das vias públicas e dos territórios mais negligenciados pelo poder público;

  • Disponibilização de chips de celular com internet pública livre e móvel - com boa qualidade - nos territórios para famílias referenciadas nos serviços da assistência social para que tenham acesso aos serviços, benefícios, audiências, sem a necessidade de se deslocar para outros territórios;

  • Implantação de Polos de Atendimento Exclusivo para Covid-19 nos territórios. Os Polos serão fundamentais para preservar as unidades de atenção primária, e para permitir uma triagem de pacientes com sintomas de síndrome gripal. A eles devem estar articulados um programa de gestão dos leitos hospitalares e de acesso a ambulâncias;

  • Uso dos prédios das escolas públicas ou de outros espaços públicos existentes para a realização de quarentena assistida por indivíduos com sintomas da doença, mas que não precisam de internação hospitalar.
7. Coordenação e apoio social
  • Implantação de “Painel de Situação da Covid-19” para os territórios, e aglomerados de pequenas e médias ocupações como ferramenta fundamental de monitoramento para o trabalho dos Centros de Referência;

  • Sistematização de informações qualitativas trazidas pela comunidade e por agentes comunitários de saúde, a fim de assegurar que o apoio social possa chegar tempestivamente a todos os que dele necessitam. Por isso mesmo, o Centro de Referência deverá ter papel de coordenador das ações sociais, otimizando recursos e esforços, e articulando as redes locais com redes de solidariedade compostas por diferentes segmentos da cidade. Por meio dessa rede, renda, alimento, equipamentos de higiene e máscaras poderão chegar a todos que deles necessitam.
8. Apoio e agilização dos sepultamentos.
·         É preciso que se crie, em caráter extraordinário, procedimentos que agilizem e facilitem o sepultamento de mortos. E isso inclui o reforço do serviço de remoção gratuita dos corpos, e o apoio financeiro aos serviços funerários. Além de todo cuidado com os funcionários que executam essa atividade.


O FORTSUAS Baixada Santista se coloca à disposição dos municípios da região, para dialogar e colaborar para a construção de planos de contingência e planejamentos técnicos de trabalho social que contribuam dentro de cada realidade municipal à um atendimento digno e de efetivação de direitos à população.

Santos, 08 de Maio de 2020.

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